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Aspectos práticos da alteração da Lei de Franquias

Com a entrada em vigor da lei alterações significativas deverão ser percebidas pela comunidade empresarial

Aspectos práticos da alteração da Lei de Franquias
Sua Franquia Publicado em 02 de Abril de 2020 às, 17h10. Atualizado em 10 de Julho de 2023 às, 23h59.

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A partir de março de 2020 entrará em vigor a Lei 13.966, de 26 de dezembro de 2019, a qual versa sobre o sistema de franquias no Brasil, restando revogada a lei anterior que disciplinava o tema (Lei 8.955/94). Com a entrada em vigor da referida lei algumas alterações significativas deverão ser percebidas pela comunidade empresarial brasileira.

Talvez a mais importante alteração trazida pela Lei 13.966/19 refere-se à relação existente entre franqueador e franqueado, restando expressamente consignado que não se trata de uma relação de consumo, dirimindo discussões judiciais sobre que se arrastam até os dias atuais, como o fato de o contrato de franquia ser de adesão e a vulnerabilidade do franqueado frente ao franqueador.

A celeuma se funda principalmente no fato de existirem duas empresas na relação de franquia (franqueador e franqueado), havendo a possibilidade do Judiciário, por vezes, analisar a questão sob o aspecto da hipossuficiência de uma das partes, notadamente o franqueado, como ensina Cláudia Lima Marques[1]:

“Certo é que a ‘vulnerabilidade’, no dizer de Antônio Hermann Benjamin, é a ‘peça fundamental’ do direito do consumidor, é o ‘ponto de partida’ de toda sua aplicação aos contratos.

Em se tratando de vulnerabilidade fática, o sistema do CDC a presume para o consumidor não-profissional (o advogado que assina um contrato de locação abusivo porque necessita de uma casa para a sua família perto do colégio dos filhos), mas não a presume para o profissional (o mesmo advogado que assina o contrato de locação comercial abusivo, para localizar o seu escritório mais próximo do fórum), nem a presume para o consumidor pessoa jurídica (veja art. 51, I, in fine, do CDC).

"Isto não significa que o Judiciário não possa tratar o profissional de maneira ‘equivalente’ ao consumidor, se o profissional efetivamente provar a sua vulnerabilidade, que levou ao desequilíbrio contratual.

Dessa forma, eventuais desequilíbrios da relação entre franqueado e franqueador, com a nova lei em vigor, não deve ser apreciado pelo Judiciário sob o viés da relação de consumo, ante a atual legislação afastar de forma expressa o Código de Defesa do Consumidor.

Cabe destacar que referida alteração não retira do franqueado a possibilidade buscar o judiciário para dirimir eventuais impasses na relação de franquia firmada, visto que o Código Civil vigente, o qual trouxe em si o princípio da boa-fé objetiva, também deve, e poderá, salvaguardar tanto o franqueado como o franqueador, por óbvio.

Contudo, em linhas gerais, normalmente a discussão com relação a existência ou não de consumo é trazida à lume pelo franqueado por este entender ser a parte geralmente mais vulnerável do negócio jurídico firmado (franquia), mas mesmo assim o Código Civil pode ser aplicado frente aos seus anseios.

Nos termos dos artigos 421[2] e 423[3], ambos do Código Civil, aplicáveis aos contratos de franquia ante a necessidade de sua adesão, a relação existente entre franqueado e franqueador encontra guarida na função social do contrato, assim como na interpretação mais favorável ao aderente, passando a contratação, dessa forma, ante a expressa previsão da nova Lei de Franquias (Lei 13.966/2019) a ser analisada sob esta ótica, e não mais pelo Código de Defesa do Consumidor.

Em outras palavras, como o contrato de adesão possui características diferentes das dos contratos padrões (convencionais), nos quais a vontade das partes contratantes é objeto de apreciação e expressa já na elaboração de suas cláusulas, torna-se imprescindível a possibilidade de sua alteração caso haja confronto de interesses dos envolvidos com os que a sociedade como um todo protege, tais como a dignidade da pessoa humana, a vida, os direitos e garantias individuais previstos na Constituição Federal (função social dos contratos).

Portanto, nada obstante essa importante alteração da legislação que tem como um de seus objetivos desafogar o judiciário e trazer mais segurança jurídica na elaboração de tais contratos, visando mais uma vez fomentar a economia, ante o crescimento das franquias no mercado brasileiro[4], tem-se como certo que ainda há a possibilidade de se discutir as cláusulas contratuais firmadas desde haja, de fato, um evidente desequilíbrio na relação franqueado x franqueador.

Outro ponto que chama atenção na atual legislação que regerá as franquias a partir de 26 de março de 2.020 refere-se à possibilidade de sublocação de imóvel entre franqueado e franqueador, havendo ainda a possibilidade do franqueador cobrar valor superior ao que paga ao proprietário do imóvel na locação originária do ponto comercial, desde que não implique excessiva onerosidade ao franqueado, garantida a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da sublocação na vigência do contrato de franquia, nos termos do artigo 3º, parágrafo único[5], da Lei 13.966/2019.

Nada obstante, tal alteração encontra óbice na Lei 8.245/91, conhecida como Lei de Locação, uma vez que seu artigo 21 proíbe de forma taxativa a possibilidade de se cobrar na sublocação valor superior ao da locação, prevendo de forma expressa a possibilidade do sublocatário reduzir o aluguel.

Tratando-se de recente alteração, inevitavelmente será objeto de controvérsias, cabendo a resolução da celeuma ao judiciário, ocasionando inevitavelmente novas demandas e possível acúmulo de ações frente ao já sobrecarregado Poder Judiciário.

No mais, a nova Lei de Franquias traz, em geral, benefícios às partes contratantes. Exemplo disso é a manutenção da previsão já contida na legislação anterior acerca da relação entre franqueador e franqueado não gerar vínculo de emprego, restando renovada a segurança jurídica em tais contratos, eis que as partes previamente já têm conhecimento de que não há relação de emprego.

A atual legislação trouxe também novos requisitos à Circular de Oferta de Franquias, na tentativa de trazer maior transparência e segurança jurídica principalmente aos franqueados que devem aderir ao contrato de franquia, ante a possibilidade de arguição de nulidade do negócio jurídica com a devolução de todas e quaisquer quantias já adimplidas ao franqueador.

Além disso, em acréscimo ao já previsto na lei anterior que a Circular de oferta de franquia deveria ser por escrito e em linguagem clara e acessível, agora o atual artigo 2º, da Lei 13.966/19 determina que também o seja em língua portuguesa invariavelmente, além da possibilidade da franqueadora ser empresa estatal ou entidade sem fins lucrativos e ainda a previsão de elaboração de contratos internacionais, em contraponto ao artigo 8º da Lei 8.955/94, que previa a possibilidade de franquias somente aos sistemas de franquia instalados e operados no território nacional.

 

[1] MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 335

[2] Art. 421.  A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.

[3] Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.

[4] https://www.consumidormoderno.com.br/2020/01/28/nova-lei-das-franquias-muda/

[5] Art. 3º […]

Parágrafo único. O valor do aluguel a ser pago pelo franqueado ao franqueador, nas sublocações de que trata o caput, poderá ser superior ao valor que o franqueador paga ao proprietário do imóvel na locação originária do ponto comercial, desde que: […]

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IGOR SA GILLE WOLKOFF – Advogado atuante nas áreas trabalhista e empresarial e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela Faculdade Cândido Mendes e MBA em Direito Empresarial pela FGV.

JOÃO UBIRAJARA SANTANA JUNIOR – Advogado atuante na área trabalhista e sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas coordenando a Unidade de Campinas. Possui especialização em Direito e Processo do Trabalho pela PUC Campinas e atualmente MBA em Gestão e Business pela FGV.

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