A franquia é um sistema de negócios dinâmico e com amplas possibilidades de aprendizado na área do empreendedorismo. Nesse sistema, o franqueador passa ao franqueado uma série de conhecimentos agregados ao negócio (também conhecido como know-how ou “saber-fazer”), além de permitir o uso da marca e outros ativos que componham a franquia. Entretanto, este tipo de negócio também exige que o franqueado assuma algumas responsabilidades e obrigações durante e até mesmo após a execução do contrato, o que torna o contrato de franquia complexo e desafiador. Uma das cláusulas responsáveis por este fator de complexidade é a “cláusula de não concorrência”.
Também denominada de “cláusula de barreira”, ela estabelece que o franqueado não possa atuar no mesmo segmento de atividade da franquia, em determinada área ou região, por certo tempo. Isto significa que após o término do contrato, o ex-franqueado não poderá abrir, durante um período, um novo negócio na mesma área de atuação da sua antiga franquia. O motivo é simples: o know-how adquirido pelo então franqueado configura um conhecimento obtido naquele período em que ele detinha a franquia, bem como uma vantagem competitiva em relação aos demais proprietários de franquias daquela rede. Um novo negócio, mesmo que com uma nova marca no mercado, naturalmente se aproveitaria de todo o know-how adquirido na época que era franqueado, o que caracterizaria uma concorrência desleal com o antigo franqueador e com os seus franqueados.
A cláusula de não concorrência possui três elementos essenciais que a definem: (I) objeto, que vai delimitar o escopo de não atuação do ex-franqueado, por exemplo caso a franquia seja do segmento de comida japonesa, o franqueado não poderá atuar nesse segmento; (II) aspecto territorial, ou seja, é o espaço geográfico que o ex-franqueado deverá se abster de atuar, como por exemplo, um bairro, município, estado ou até mesmo o território nacional como um todo; e (III) aspecto temporal, que corresponde ao tempo que o ex-franqueado ficará impedido de atuar no mesmo segmento de mercado do franqueador e no território estabelecido no contrato. Normalmente, essa cláusula tem validade de dois anos, mas pode alcançar até cinco anos. Estes parâmetros devem ser pensados com cuidado, pois precisam estar em consonância com os princípios da livre iniciativa e livre concorrência.
Outro aspecto importante a ser observado nessa mesma cláusula é que esta poderá ser aplicada também a sócios e parentes próximos do franqueado. A lógica desta previsão extensiva é que o ex-franqueado poderia facilmente repassar seus conhecimentos adquiridos a pessoas próximas a ele, em uma tentativa de fraudar a referida cláusula.
A cláusula de não concorrência protege o bom funcionamento da relação entre os franqueadores e franqueados, uma vez que mantém protegido o conhecimento gerado pela franquia, evitando, assim, que o trabalho de desenvolvimento do negócio seja prejudicado ou perdido por culpa do aproveitamento desleal de ex-franqueados.
Como pode ser observado, o contrato de franquia possui diversas peculiaridades. A cláusula de barreira é um dos pontos-chave da negociação entre as partes envolvidas, sendo importante redobrar os esforços para uma boa redação e interpretação desta. Isso demonstra que o contrato de franquia deve ser muito bem redigido, e acompanhado por advogados especializados no tema.
Gabriel di Blasi é advogado,sócio do escritório Di Blasi, Parente & Associados. Sua prática abrange questões nacionais e internacionais, incluindo patentes, desenhos industriais, segredos empresariais, cultivares, contratos de licenciamento e de franquias, gerenciamento de tecnologia e de inovação tecnológica, marcas e direitos autorais. Ele também é o atual diretor jurídico da ABF-Rio.