Vivemos uma era de contradições na indústria da moda. Enquanto nunca se produziu e consumiu tanto, os impactos ambientais desse ritmo desenfreado se tornam cada vez mais alarmantes. A resposta a esse cenário não é apenas uma tendência: é uma necessidade urgente. A moda circular surge como um dos pilares mais promissores para redefinir o futuro do setor.
Diferente do modelo linear tradicional, aquele que produz, consome e descarta, a moda circular propõe um ciclo inteligente, em que materiais são reaproveitados, peças ganham novas vidas e o desperdício deixa de ser uma consequência natural da cadeia produtiva.
Mas a transformação não passa apenas pela adoção de tecidos reciclados ou processos mais limpos. Ela exige uma mudança estrutural na mentalidade de quem produz, de quem cria e, sobretudo, de quem consome.
Os números são claros. Segundo o relatório Fios da Moda, desenvolvido pela FGV em parceria com o Instituto Modefica, o Brasil produz anualmente mais de 9 bilhões de peças de roupa. Só na etapa de corte e costura, perdemos até 25% dos tecidos, como algodão, poliéster e viscose, materiais que exigem recursos naturais valiosos e que, quando descartados de forma incorreta, alimentam um dos setores mais poluentes do planeta.
Sim, a indústria da moda já ocupa o posto de segunda maior poluidora do mundo. E fingir que isso não é problema nosso não é mais uma opção. O modelo do fast fashion, que prioriza velocidade, baixo custo e alto volume, alimentou o consumo massivo nas últimas décadas, ao custo de impactos sociais e ambientais devastadores. Na contramão, movimentos como o slow fashion e, principalmente, a moda circular, surgem como agentes de transformação, não apenas no processo produtivo, mas na própria relação entre marcas, consumidores e o planeta.
Repensar design, materiais, ciclos de vida dos produtos, sistemas de reaproveitamento, logística reversa e, acima de tudo, um novo modelo mental, no qual criar valor não depende de extrair, produzir e descartar, mas de prolongar, regenerar e circular.
Como diretor da Sigbol, uma das mais tradicionais escolas de moda do Brasil, vejo de perto o quanto a formação dos novos profissionais precisa acompanhar essa mudança. Ensinar moda hoje não é só sobre modelagem, corte e costura. É sobre formar profissionais conscientes do impacto que geram no mundo. Aqui, na prática, mostramos aos nossos alunos que sustentabilidade não é discurso: é atitude. Incentivamos desde o desenvolvimento de coleções com reaproveitamento de tecidos até projetos que envolvem brechós, trocas, doações e reciclagem de peças.
Porque a moda do futuro não é aquela que lança tendências passageiras, mas aquela que constroi impacto positivo, valor social e responsabilidade ambiental. O setor que sempre ditou tendências precisa, agora, liderar uma transformação estrutural. A moda circular não é uma possibilidade distante, é uma urgência que já está batendo à porta. E quanto antes formarmos profissionais preparados para esse novo cenário, mais rápido a indústria deixa de ser parte do problema e se torna parte da solução.
Aluizio de Freitas é sócio-diretor da Sigbol Fashion
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