As empresas familiares desempenham um papel crucial na economia mundial, sendo responsáveis por uma significativa parcela do PIB e da geração de empregos em diversos países. No entanto, sua estrutura, caracterizada pela sobreposição de laços familiares e interesses empresariais, traz desafios únicos que podem comprometer a longevidade e a estabilidade do negócio.
Nesse contexto, a implementação de boas práticas de governança corporativa é essencial para alinhar interesses, promover a transparência e garantir a continuidade da organização. A governança em empresas familiares refere-se ao conjunto de regras, práticas e processos implementados para equilibrar os interesses da família, dos gestores e da empresa como um todo. Ela busca estruturar a tomada de decisões, definir papéis e responsabilidades e minimizar conflitos, garantindo um ambiente saudável para o crescimento do negócio.
Essa gestão é fundamental, tendo em vista os desafios específicos enfrentados pelas empresas familiares, como o envolvimento emocional dos membros da família, podendo levar a dificuldades em decisões racionais e estratégicas, especialmente quando há divergências de interesses.
Outro ponto desafiador é que nem todas as empresas familiares possuem um plano claro de sucessão, o que pode levar à instabilidade em momentos de transição de liderança, em especial se houver algum afastamento brusco e inesperado por parte de um pilar da família e/ou dos negócios. O que se agrava quando há concentração de decisões em poucos membros da família, podendo, ainda, limitar a inovação e criar uma dependência excessiva de líderes individuais.
Por fim, mas não menos importante, é fundamental que haja transparência para o mercado sobre a estrutura da Companhia sob pena de causar insegurança nos stakeholders. Sem uma governança bem definida, a falta de transparência pode gerar desconfiança entre os stakeholders, dificultando o acesso a financiamentos e investimentos.
Os benefícios, por sua vez, são atrativos, tendo em vista que ao passo que evita conflitos familiares, profissionaliza a gestão do negócio, garantindo que todos persigam um objetivo comum e tenham uma clareza das estratégias empresariais.
Com a redução de conflitos concretizada, tem-se um prognóstico de sustentabilidade e longevidade dos negócios, que não serão atravessados por conflitos que não sejam diretamente deles, afinal, já temos desafios suficientes no meio empresarial.
A definição de papéis e da linha de sucessão garante, ainda, a família e ao mercado um alinhamento em expectativas, fazendo com que, muitas vezes, possam-se procurar no ambiente externo, um gestor especializado para representar corporativamente a Companhia, garantindo ainda, ainda mais imparcialidade e segurança para os interessados em fazer negócios com o grupo.
Consequentemente, a atração de investimentos aumenta, não sendo o ‘fato familiar’ um risco de negócio, posto que a estrutura de governança já apontou que há uma característica de constituição familiar, mas que há, da mesma forma, a preocupação com o empreendimento de forma separada dos interesses pessoais da família.
Alguns elementos, portanto, são indispensáveis para uma Companhia que pretenda ter governança corporativa em seu negócio. O primeiro deles é o acordo familiar que é um documento que estabelece as regras de convivência e as diretrizes para a gestão do negócio, incluindo a política de entrada de membros da família e os critérios de sucessão.
O conselho de administração também é fundamental, tendo em vista que ele deve ser composto por membros da família e profissionais externos, sendo responsável por supervisionar a gestão e alinhar as decisões estratégicas, em uma visão mais macro do negócio.
Mesmo que o acordo familiar já aborde sobre a sucessão em seu corpo, estruturar um plano de sucessão garante ainda mais transparência e segurança, por ser um planejamento detalhado e claro para a transição de liderança, reduzindo, assim, a probabilidade de disputas e a necessária garantia da continuidade do negócio.
A presença de profissionais especializados e externos na gestão e conselho, auxiliam na separação de papéis necessários aos membros da Companhia que integrem a gestão, garantindo que cada função seja desempenhada de forma clara e eficiente, e, principalmente livre de conflitos de interesses reais ou potenciais.
A estrutura construída deve priorizar a comunicação aberta e a prestação de contas, tanto para membros da família quanto para os stakeholders, buscando, assim, a conciliação dos interesses de cada um. A governança em empresas familiares é mais do que uma ferramenta de organização; é uma estratégia indispensável para garantir a sustentabilidade, a harmonia e o crescimento do negócio a longo prazo. Ao adotar práticas de governança, as empresas familiares não apenas superam seus desafios internos, mas também se posicionam como protagonistas em um mercado cada vez mais competitivo.
O equilíbrio entre os valores da família e a eficiência corporativa é o que transforma empresas familiares em legados duradouros. Com a orientação jurídica certa, uma visão de negócios estratégica e pessoas-chave em posições estratégicas, é possível implementar uma governança que respeite as tradições da família e impulsione o sucesso empresarial.
Por Amanda Ramalho, que é especialista em Direito Empresarial e Compliance. Com mestrado em Direito pela Universidade da Amazônia (UNAMA), Doutoranda em Direito Comercial pela PUC/SP e colunista da Plataforma Sua Franquia.